Este texto nos foi gentilmente oferecido por mais uma colaboradora profissional, a psicóloga clínica Débora Franco, e nos traz uma visão sobre as causas de comermos errado, vindo lá da infância. Sabia que ainda podemos salvar, pelo menos, nossos filhos?
Outro
dia, fui a uma consulta com meu médico que me auxilia no processo de
emagrecimento. Antes que
ele tivesse chance de falar qualquer coisa, eu fui logo dizendo: este mês eu engordei 5 kg. Depois, dei um sorrisinho que todo gordinho simpático sabe dar para amenizar o conteúdo do discurso. Ele reagiu perguntando por que eu tinha engordado. Numa resposta simples e objetiva, disparei que estava comendo mais açúcar. Em seguida ele repetiu a pergunta: OK, mas por que você engordou?
ele tivesse chance de falar qualquer coisa, eu fui logo dizendo: este mês eu engordei 5 kg. Depois, dei um sorrisinho que todo gordinho simpático sabe dar para amenizar o conteúdo do discurso. Ele reagiu perguntando por que eu tinha engordado. Numa resposta simples e objetiva, disparei que estava comendo mais açúcar. Em seguida ele repetiu a pergunta: OK, mas por que você engordou?
Esta
situação me inspirou para escrever este texto. Afinal, por que engordamos ou
compensamos nossas frustrações em alimentos ricos em açúcares? Por que chegamos
à obesidade apesar de vários alertas que recebemos durante o processo de
engordar? Quais as situações que levam ao indivíduo comer ao ponto de
prejudicar sua saúde, seu aparelho locomotor, suas relações afetivas e sociais?
Obesidade
é um tema da moda agora. Todos os segmentos de saúde têm uma opinião formada sobre
os alimentos vilões da boa forma. Eu
prefiro focar nas experiências associadas à apresentação dos alimentos.
Acho que concordamos que a infância é a fase
fundamental para uma educação nutricional adequada e, conseqüentemente, alimentação equilibrada, entretanto, muitos pais pecam nas explicações na
oferta dos alimentos naturais. Muitos usam ‘você
tem que comer’ ou ‘coma para não
ficar doente’ ou ‘se comer você vai
ficar mais forte’, só que a criança tem uma forma muito particular de
enxergar a saúde (Tô correndo, Tô
brincando, Tô cheio de saúde). Convenhamos
que, se isto funcionasse, o marinheiro Popeye seria o grande educador nutricional
e todas as crianças seriam comedoras compulsivas de espinafre para ficarem
fortes e saudáveis. De fato, a aquisição de novos comportamentos na infância
tende a ser eficiente se a criança compreende a funcionalidade do que está
sendo transmitido através das regras sociais e/ou parentais, porém, seu paladar
é dominado pelos sabores presentes nos vegetais.
Sendo
assim, surge uma outra dúvida: como fazer a criança se interessar por alimentos
que por si só não são tão palatáveis quanto aqueles que são industrializados?
Aqui entra o valor da experiência. Mais importante que a idade na qual são
apresentados os alimentos saudáveis são as condições nas quais estes
comportamentos são aprendidos, isto é, se a aprendizagem ocorre em um ambiente
fortalecedor e positivo ou se esta se desenvolve em contexto coercitivo de
queixas e castigos. Muitos descartam que muitos alimentos não considerados
‘saudáveis’ são ofertados em momentos de alegria, descontração e afeto. A sobremesa vem após ter comido brócolis
(recompensa pelo esforço???). A pizza marca as reuniões de família. Ninguém se
reúne para comer salada. Isto faz com que haja uma associação positiva do
alimento dito ‘não-saudável’ aos sentimentos que foram evocados no ato da sua
apresentação que são muito, muito agradáveis. Por outro lado, comer alface,
agrião e outros do gênero ocorrem em circunstâncias de ameaça e punição (coma se não...).
Na fase adulta essas experiências se
generalizam na escolha de alimentos nas principais refeições. Muitos preferem
comer o que ‘aquece o coração’, ‘ lembra
a comida da vovó’ ou ‘tem gosto de infância’. Os afetos são estímulos
poderosos na manutenção de certos tipos de comportamento que perduram ao
longo da vida.
Eu
pessoalmente não gosto de proibir principalmente se eu como. Como pais, temos que nos esforçar em dar modelos adequados
sobre comportamentos almejados em nossos filhos. É necessário ter coerência no
dizer e fazer. Se é tão bom, por que não sentamos juntos e experimentamos? Punições e restrições não terão caráter tão
ameaçador quando os filhos chegarem à adolescência. O ideal é o bom senso e
experimentar, com a mesma disposição, todos os tipos de alimentos.
E se eu odiar couve flor? Primeiro evita dizer
que odeia na frente da criança. Assim você forma um conceito fechado de que
aquele alimento não presta. Eu já ouvi vários pais dizerem que seus filhos ‘puxaram’ ao seu gosto. Fala sério! RS!
Você pode trazer o tio que gosta de palmito, a vovó que revira os olhos ao
comer cenoura como modelos afetivos e confiáveis para a criança. É possível
também criar receitinhas onde o couve flor seja mais atraente ao seu paladar.
Já fez uma pizza low carb com couve
flor? Faz uma pesquisa de receitas
criativas e saborosas. A idéia é ser uma experiência rica para todos e que
evoquem sentimentos genuínos. Convida seu filho para fazer junto com você.
Quando a criança se envolve no preparo de receitas ela quer participar de todas
as etapas, inclusive a de comer.
Em
alguns casos os pais precisam de um reforço na educação e manutenção de bons
hábitos alimentares da família. A
obesidade é um problema resultante de uma rede complexa de fatores que envolvem
a vulnerabilidade emocional, a genética e a forma que o indivíduo se relaciona
com a comida. Independente do
valor nutricional, a comida considerada ‘não-saudável’ se mantém pelo seu valor
hedônico (prazer), ou seja, é bom, é
gostoso. O treino para substituição de desvios nutricionais não pode se
limitar a conscientização, mas deve ter uma forma ampliada de intervenção com
uma equipe multidisciplinar que mude a relação/experiência do individuo com o
comer.
Se o profissional utilizar uma abordagem com fortes críticas acerca do
processo de emagrecimento, provavelmente o cliente desistirá. O profissional deve
se lembrar que ele aponta os caminhos, mas cabe ao paciente suportar os
percalços da sua caminhada.
Débora Franco
deborafrancopsi@yahoo.com.br
71 9183-0049
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